Alguns pensadores como Gary Hamel estão considerando a empresa brasileira um modelo de gestão. A empresa opera sem cargos, chefes, metas e mesmo orçamento e mesmo assim esta empresa de tecnologia Vagas administra uma cartela de 2.400 clientes e obtém um crescimento médio anual de 25%. A companhia acredita que abrir mão da hierarquia é o melhor instrumento para conseguir compartilhar valores com a sua equipe, e não está sozinha.
Foi no mês passado maio/14, que esta empresa brasileira
convenceu um time de especialistas internacionais – entre eles o guru Gary Hamel – de que sua estrutura horizontal é um
exemplo a ser seguido. Ela foi uma das sete vencedoras do prêmio M-Prize,
concedido pela The Management Innovation eXchange (MIX), um projeto que reúne
pensadores para “reinventar a gestão no século 21”.
Na Vagas, os funcionários não têm
cargos definidos, mas funções. Também não existe relação de mando e todas as
decisões, desde as contratações até o valor dos salários e o plano estratégico
da empresa, são tomadas em consenso entre a equipe.
O fundador da companhia, Mário Kaphan explica: “Mas não é uma democracia, não é por voto. Todos têm que
concordar ou, no máximo, consentir. Isso significa que alguém, mesmo achando
que tem uma solução melhor, pode acreditar que outra ideia tem potencial e se
engajar nela. Ele também diz que, para que o modelo funcione, os empregados
precisam constantemente se desapegar de suas propostas. “As pessoas estão lá
para serem convencidas e não para vencer a discussão”.
E quando não se consegue chegar a um acordo, o
debate é postergado e as ideias são amadurecidas e, depois, colocadas em cheque
novamente. Sendo assim, a impressão que fica é de que todas as resoluções na
empresa levam uma eternidade para acontecer. Mas, a realidade não é bem assim.
Segundo Kaphan, “uma pessoa pode chegar em consenso por si só. Ela pode tomar
uma decisão sozinha, pressupondo que o restante da empresa irá concordar. Desde
que ela saiba que aquele julgamento pode ser reversível e esteja aberta a uma
controvérsia posteriormente, não há problema”.
Ainda de acordo com ele, cabe a cada funcionário
resolver se toma uma atitude sozinho ou se convoca o time para partilhar a
questão, dependendo do quanto ele acredita que aquela ação irá expor a empresa.
“Dentro dessa dinâmica, é muito raro que a gente tenha uma decisão postergada
por falta de consenso”, garante.
Para Kaphan, apesar de mais complexo, esse processo
de despacho acaba sendo mais rápido na Vagas do quem em organizações com
estrutura tradicional. “É claro que um gestor pode acertar em dois
minutos algo que, debatido em grupo, leva-se meia hora. Mas em uma hierarquia,
essa decisão tem que entrar em uma fila até chegar à presidência para
aprovação. Aqui não tem essa espera. Uma vez que há consenso, já está
resolvido, porque todos estão engajados”.
Como fica a estrutura?
Há cinco anos, a empresa que foi fundada há 15, é
organizada sob o ponto de vista do consenso. Atualmente, os 160 empregados são
distribuídos entre 26 equipes funcionais (como recursos humanos, finanças e
pesquisa e desenvolvimento) e oito comitês.
Esses comitês são temporários e criados em acordo
entre toda a empresa sempre que há a necessidade de que as equipes atuem de
forma multifuncional (como no planejamento de segurança da informação, por exemplo). O número de comitês que existirá em cada ano é definido em conjunto
durante o planejamento estratégico que, por sua vez, também é estruturado de
forma colaborativa.
Tudo começa com uma discussão entre a companhia inteira,
numa reunião que acontece em novembro. Na ocasião, cada um pode opinar
sobre quais objetivos quer que a companhia siga no ano seguinte. Este debate
continua na intranet até que, em janeiro, por meio de uma enquete, 16 pessoas
com visão estratégica são escolhidas em uma enquete para escolher quais serão
os direcionadores para aquele ano. É o grupo que assume o comitê de gestão para
o período.
Neste ano de 2014, foram definidos oito
direcionadores e por isso há oito comitês. Para decidir quais empregados
assumem esses comitês, é realizada uma grande reunião à qual todos podem se
candidatar. Este ano, houve cerca de 15 candidatos para um deles, que deve ter
6 cadeiras fixas. Entre si, por meio de consenso, os próprios interessados
decidiram quem ocuparia as Vagas.
A cada 15 dias, cada uma das equipes e comitês se
reúne para, “com um olhar estratégico em empreendedor, analisar indicadores que
medem a evolução de seus propósitos e inventar formas de fazer melhor”, segundo
Kaphan. “É um esquema de planejamento feito para se adaptar a mudanças de
contexto naturalmente, porque evolui ou volta atrás a cada quinzena”, defende.
Há ainda encontros bimestrais entre os comitês para
que cada um apresente seus resultados para o período. Essa reunião dura cerca
de duas horas e tem a agenda aberta para toda a empresa. Além disso, todas as
equipes e comissões, além das cadeiras fixas, têm posições Vagas que podem ser
ocupadas por qualquer funcionário que queira contribuir apenas com um
determinado projeto ou decisão.
Sem metas e sem orçamento
O lema da empresa Vagas é extrair os melhores resultados de cada área da empresa, sem
estipular metas. Lá, não existe um ponto a ser atingido nem mesmo para o setor
comercial. Nesse caso, o indicador de sucesso é a evolução das vendas e ele é
analisado a cada uma das reuniões quinzenais, para que os integrantes da equipe
consigam enxergar oportunidades de melhoria. Após esse “raio X”, é decidido, em
consenso, se há necessidade de repensar alguma prática ou fazer um novo
investimento.
“Não saímos dizendo ‘vamos vender x’, mas sim ‘vamos vender mais porque
essa parece ser a melhor forma de crescer’. E na próxima reunião comemora-se ou
muda-se aquela resolução”, exemplifica Kaphan. Isso acontece para todas as
equipes e comitês. Além disso, ao contrário do que acontece na maioria das
empresas, a Vagas não trabalha com um orçamento anual pré-definido. A
quantia de dinheiro disponível para investimento para cada equipe e comitê é
decidida no dia a dia, nas reuniões quinzenais.
Se nesses encontros, é tomada alguma decisão que
envolve recursos financeiros, um projeto é elaborado e um orçamento é aberto
para ele. A partir daí, a proposta segue para o comitê de gestão, que
decide se ela será entra em prática ou não. Por regra, os funcionários do
financeiro não precisam ser envolvidos nas deliberações de outras equipes e
comitês. Mas eles podem ser convidados a ocupar cadeiras vazias quando os
projetos são muito grandes. “Isso envolve a responsabilidade das pessoas
de entenderem o tamanho de suas decisões e se precisam ou não de ajuda”, diz
Kaphan.
Decidindo salários
Apesar de não serem organizados em cargos, os
funcionários da Vagas têm salários “absolutamente diferentes” e que variam em
função da sua contribuição para a empresa. Desde o começo deste ano, a
companhia usa uma metodologia de remuneração colaborativa. Ela funciona de modo
parecido com o feedback 360 graus. Para ter o salário definido, cada empregado
se autoavalia e é analisado por toda a sua equipe e por qualquer outra pessoa
que se interesse.
Essa avaliação passa por quatro pontos. O primeiro
é o conhecimento
do profissional quanto ao negócio da Vagas, dos
projetos comuns de toda empresa. Em seguida, vem o foco nos resultados, ou seja,
o quanto ele contribuiu para a melhoria dos indicadores da sua área.
Depois é analisada a vivência da cultura da empresa
(é observado o quanto ele participa das
decisões em consenso e se toma iniciativa de abrir controvérsias nesses
processos, seja por meio de conversas informais ou ocupando cadeiras vazias nas
equipes e comitês. Também é avaliado o quanto ele consegue desapegar de uma
ideia própria quando alguém a coloca em cheque). Por último, são avaliadas as competências técnicas do funcionário.
Essas “entrevistas” são comandadas pela equipe de
recursos humanos, por meio de um software na intranet. Em seguida, as
análises são encaminhadas para o comitê de remuneração, para que ele contribua.
“O objetivo é que a remuneração seja justa
internamente e ao mesmo tempo seja adequada em relação ao mercado”, afirma
Kaphan. Para isso, a empresa contratou uma consultoria externa para estimar o
salário de cada trabalhador em paralelo com outras companhias. “Foi muito
difícil. Como não há cargos, eles tiveram que perguntar para cada pessoa o que
ela fazia ali”.
Todos os empregados da Vagas têm os salários
definido nesse processo, exceto Mário Kaphan e seu sócio. Apesar de também
serem avaliados, eles recebem de acordo com a distribuição de lucros, já que
são os donos da companhia. Mesmo sendo o fundador da empresa e participando de
grande parte das decisões, Kaphan não tem o título de presidente da
organização. “Não sou CEO e não tenho voz de mando. Na prática, sou um
abridor de controvérsia. Meu papel é ir às reuniões para discutir e não definir
como as coisas devem ser feitas. Tenho o maior prazer em ser vencido em uma
discussão”, afirma.
E daqui pra frente?
O fundador da empresa diz não ter medo do que vem
por aí. Se a média de crescimento da Vagas se mantiver, ela dobrará de
tamanho em apenas quatro anos. “Estamos muito confiantes de que, com os
processos estruturados, nossa estrutura funcionará para até 500 funcionários.
Mas não estamos preocupados com isso”, diz Kaphan.
Ele prega que desapego é palavra de ordem em todas
as decisões da empresa e que ela vale inclusive para a gestão.“Continuaremos
em reinvenção. Mas, aqui, cada um é livre para tomar decisões ou para pedir
ajuda para tomá-las. Assim, os empregados podem viver os seus valores (e não os da empresa) no ambiente profissional. Na hora em que existir um nível de hierarquia
que tem poder de delegar, essa vivência compartilhada é quebrada”, afirma.
Fonte e Sítios consultados
http://exame.abril.com.br
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