Sabe-se que Karl
Marx nasceu em Trèves, cidade ao sul da Prússia Renana, na
fronteira da França, em 5 de Maio de 1818, ele era o filho mais novo de
uma família judaica de classe média da cidade. Filho de Herschel Marx,
advogado e conselheiro da justiça, e devido a sua descendência de judeus, foi
perseguido pelo governo absolutista de Frederico Guilherme III.
Trajetória de Karl Marx
·
Em 1835 concluiu o curso ginasial no
Liceu Friedrich Wilhelm.
· Ainda nesse ano e boa parte de 1836,
Karl estudou Direito, História, Filosofia, Arte e Literatura na Universidade de
Bonn em Iena.
· No ano de 1841 obteve o seu
doutoramento em Filosofia com uma tese Sobre as diferenças da filosofia da
natureza de Demócrito e de Epicuro.
· Marx foi um filósofo e revolucionário
alemão.
· Ele criou as bases da doutrina
comunista, onde criticou o capitalismo.
· A sua filosofia exerceu influência em
várias áreas do conhecimento, tais como Sociologia, Política, Direito,
Teologia, Filosofia, Economia, entre outras.
Ainda no final de 1836, Marx foi para
Berlim, onde se propagam as ideias de Hegel, destacado filósofo e idealista
alemão. Marx se alinha com os "hegelianos de esquerda", que procuram
analisar as questões sociais, fundamentados na necessidade de transformações na
burguesia da Alemanha. Entre 1838 e 1840, dedica-se a elaboração de sua tese,
em busca de um cargo de professor. Em 1841, na Universidade de Iena, apresenta
o trabalho "A Diferença Entre a Filosofia da Natureza de Demócrito e a de
Epicuro".
Por motivos políticos, Karl não é
nomeado, as universidades não aceitam mestres que seguem as ideias de Hegel.
Desiludido, dedica-se ao jornalismo. Escreve artigos para os Anais Alemães, de
seu amigo Arnold Ruge, mas a censura impede sua publicação. Em outubro de 1842,
muda-se para Colônia, e assume a direção do jornal Gazeta Renana, mas logo após
a publicação do artigo sobre o absolutismo russo, o governo fecha o jornal.
Em julho de 1843, casa-se com Jenne,
irmã de seu amigo Edgard von Westphalen. O casal muda-se para Paris, onde junto
com Ruge funda a revista "Anais Franco Alemães", onde publica os
artigos de Fredrich Engels. Marx publica "Introdução à Crítica da
Filosofia do Direito de Hegel" e "Sobre a Questão Judaica".
Ingressa numa sociedade secreta, mas é expulso da cidade.
Publica em 1848 o "Manifesto
Comunista", onde já esboça suas principais ideias com a luta de classes e
o materialismo histórico. Em fins de 1844, Marx começa a escrever para o
"Vornaerts" em Paris. As opiniões desagradam o governo de Frederico
Guilherme V, imperador da Prússia, que pressiona o governo francês a expulsar
os colaboradores da publicação, entre eles Marx e Engels. Em fevereiro é obrigado
a sair da França. Vai para Bélgica.
Dedica-se a escrever teses sobre o
socialismo e mantém contato com o movimento operário europeu. Funda a
"Sociedade dos Trabalhadores Alemães". Junto com Engels, adquirem um
semanário e se integram à "Liga dos Justos", entidade secreta de
operários alemães, com filiais por toda a Europa. No 2º Congresso da Liga, são
solicitados para redigir um manifesto. Com base no trabalho de Engels, Os
Princípios do Comunismo, Marx escreve o "Manifesto Comunista", que
envia para Londres em Janeiro de 1848.
Na obra, Karl critica o capitalismo,
expõe a história do movimento operário, e termina com um apelo pela união dos
operários no mundo todo. Pouco tempo depois, Karl e sua mulher são presos e
expulsos do Bélgica. Depois de vários exílios e privações, finalmente se
instalam em Londres. Apesar da crise, em 1864 funda a "Associação
Internacional dos Trabalhadores, em Londres" que fica conhecida como
"Primeira Internacional". Com a ajuda de Engels, publica em 1867, o
primeiro volume de sua mais importante obra, "O Capital", em que
sintetiza suas críticas à economia capitalista.
Ao escrever "Crítica ao Programa
de Gotha", condena o programa que o partido socialista alemão adotara em
1875. As teorias de Marx influenciaram a Revolução Russa de 1917, teóricos e
políticos como Lênin, Trotski, Stalin e Mao Tsé-Tung. Assim, sua doutrina
esteve presente em vários países, como a extinta URSS, a China e Cuba.
Karl Heinrich Marx morre em Londres, no dia 14 de março de 1883,
em consequência de uma bronquite e de problemas respiratórios.
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A Alienação e a Emancipação do Ser Humano
A Alienação e a Emancipação do Ser Humano
O marxismo — a filosofia de Marx — é um dos movimentos filosóficos mais
importantes da história da humanidade. Neste final de século, que assistiu à
queda de regimes ditos comunistas, devemos recordar que, durante grande parte
do século XX, aproximadamente metade da humanidade viveu sob regimes políticos
inspirados no pensamento de Marx (ou que
pelo menos assim se consideravam a si próprios).
Mesmo para quem não tenha lido uma única linha de Marx, o seu nome
aparece ligado a uma ideia que provocou aceso debate no nosso século e, mais do
que isso, lutas, revoluções, medos e paixões: o comunismo.
"Proletários de todos os países, uni-vos!” Esta palavra
de ordem, lançada por Karl Marx em 1848 no final do Manifesto do Partido
Comunista, tornou-se a das Internacionais. É retomada nas bandeiras
socialistas.
Como Marx chegou a essa ideia?
·
O que era, para ele, o comunismo?
O
comunismo corresponde a uma determinada forma de organização social e econômica
que, segundo Marx, iria abolir a
exploração do homem pelo homem. Ao longo da história tem-se assistido à
alienação do homem, isto é, à sua desumanização. Marx revela ou põe em
evidência que o progresso tecnológico (o
desenvolvimento das forças produtivas, dos meios de produzir riqueza e bens que
satisfaçam as necessidades dos homens), não se tem traduzido numa
libertação e emancipação do homem.
E o século em que Marx viveu (século XX) constitui um exemplo perfeito
deste desconcertante contraste: com a aceleração da Revolução Industrial
verificou-se, em comparação com séculos anteriores, um extraordinário aumento
das fontes produtoras de riqueza (máquinas,
matérias-primas, etc.), e, contudo, as relações sociais e de produção
mostram que vivemos em um mundo completamente desumano, onde a degradação, a exploração,
a miséria e o embrutecimento da maioria dos homens atingiram, a bem dizer, o seu ponto extremo. A
análise histórico-materialista de Marx descobriu
o sentido ou a lógica profunda da evolução histórica das sociedades e dos
homens: a história dos homens tem sido praticamente desde o início, a história
da luta de classes, uma série de conflitos determinados por interesses
econômicos antagônicos. Ela é o produto deste confronto entre classes.
- Ora, as classes
sociais são o quê?
Elas são o resultado de um determinado desenvolvimento econômico da
humanidade. A classe economicamente dominante no tempo de Marx (a burguesia) constituiu-se como tal porque
soube acompanhar o desenvolvimento econômico (das forças produtivas) que
conduziu à ultrapassagem do modo de produção feudal — essencialmente agrícola —
e ao predomínio da indústria. Mas o que tem sido característico das revoluções
a que até agora assistimos é que no plano das relações de produção elas têm
mantido a opressão sobre a esmagadora maioria dos homens.
Mudam o nome do opressor e as condições de opressão, mas esta continua.
A sociedade industrial capitalista define-se pela seguinte relação entre os
homens na produção material: a burguesia detém em exclusivo a propriedade dos
meios produtivos e os operários industriais — a maioria — 50 podem encontrar
forma de subsistir ou sobreviver vendendo a única coisa que possuem, isto é, a
sua força de trabalho.
Tal desigualdade no acesso aos meios que permitem produzir bens
materiais e riqueza necessários à vida está na base da exploração. A vítima
fundamental dessa exploração é uma classe a que Marx dá o nome de proletariado.
O proletário é o trabalhador que recebe um salário miserável em troca da
riqueza e dos produtos de que o burguês — o patrão, o empresário — se apropria.
Esse salário encobre uma escravatura, uma redução do trabalhador a mero
instrumento produtivo submetido à vontade de lucro do capitalista. A existência
do proletariado é um sinônimo da inexistência de um mundo humano.
O proletário só pode sobreviver sendo
explorado, transformado numa máquina que deve produzir, com a menor despesa, o
maior lucro possível. Nestas condições, o trabalho, forma de afirmação da
humanidade do homem, perdeu essa função, tornou-se uma forma de negação do
homem, das suas potencialidades humanas: não liberta, escraviza.
Na sociedade capitalista a alienação tem duas faces: o proletário aliena-se porque nesse ato
produtivo que é o trabalho ele é escravo do desejo de lucro que constitui a
obsessão do capitalista (este reduz o
operário a uma condição animalesca); o
capitalista também está alienado (separado
da sua humanidade): obcecado pelo desejo de lucro, de acumulação de
riqueza, torna-se escravo desse desejo, não é um homem entre os homens, mas o
lobo insaciável que devora e consome a vida dos outros.
No entender de Marx, a exploração e a alienação tornaram-se
particularmente agudas com o advento do capitalismo: a obsessão tipicamente
capitalista pelo lucro intensifica a opressão, a miséria dos desfavorecidos.
Contudo, segundo a interpretação marxista, a história real dos homens é também,
paradoxalmente, a caminhada necessária para a libertação de todas as cadeias
que oprimem os homens. O comunismo, melhor dizendo, a sociedade comunista, uma
sociedade sem exploradores e sem explorados — porque sem propriedade privada dos
meios de produção — não é um ideal, não é o desejo puro e simples de uma «bela
alma» revoltada com a degradação do homem e as injustiças da sociedade
capitalista. O advento desse tipo de sociedade onde o homem poderá realizar a
sua natureza social e a sua liberdade não será o resultado de ‘prédicas moralizantes’. Ele está
inscrito no próprio movimento da história. Na Ideologia Alemã, Marx e Engels
escrevem:
O comunismo não é para nós um estado de coisas que deva ser criado, nem
um ideal sob o qual a realidade se deverá regular. Chamamos comunismo ao
movimento real que abole o estado atual.
Em outras palavras, a evolução histórica, o desenvolvimento das
forças produtivas, a passagem sucessiva do modo de produção escravagista ao
feudal e deste ao capitalista, é o lento e doloroso caminho que a história dos
homens percorreu para, necessariamente, chegar a uma sociedade justa. Já vimos
que a história era, para Hegel, um processo evolutivo necessário e não uma
sequência caótica de acontecimentos. Para Marx a história é também uma
totalidade inteligível, dotada de sentido na sua evolução. Rejeitando a ideia
hegeliana de que a força motriz dessa evolução é o Espírito (será antes o fator material ou econômico)
Marx aplica à sua interpretação materialista da história o método dialético. A
dialética percorre interiormente as relações de produção. Cada classe
economicamente dominante não pode perpetuar, embora fosse essa a sua vontade, a
sua situação privilegiada no palco histórico. Ela própria cria as condições da
sua ultrapassagem ou negação.
Referindo-se à sociedade capitalista, Marx dirá que ela nasceu da
ultrapassagem de contradições que se verificavam no seio do modo de produção
feudal (as relações de produção baseadas
na posse da terra estavam em contradição com as transformações das forças
produtivas, com a industrialização e o comércio desenvolvidos pela burguesia).
Se o desenvolvimento industrial conduziu à vitória da burguesia sobre a classe
feudal (a nobreza) ele será também a
arma que se vai virar contra os interesses da própria burguesia, ao criar uma
classe extremamente numerosa, radicalmente oposta ao modo de produção
capitalista baseado na propriedade privada de empresas, fábricas, minas,
matérias-primas, meios de transporte, em suma, dos meios produtivos.
Em
virtude do movimento dialético da história, a burguesia, ao criar o mundo
capitalista, criará também, segundo as previsões de Marx, os seus coveiros. O
advento da sociedade comunista será o resultado necessário do desenvolvimento
dialético da história. Contudo, seria simplista pensar que o movimento da
história ‘empurrará’ os homens para
esse novo mundo. Se o homem é um produto da história, esta também é feita pelos
homens. Por isso é preciso que o proletariado adquira consciência
revolucionária, isto é, não tenha só existência econômica (como objeto de exploração e opressão), mas também consciência de
classe, do seu estatuto econômico. O materialismo histórico-dialético é o
instrumento de conscientização revolucionária da classe operária, é a doutrina
que, negando as ilusões de que ela é vítima, mostrando-lhe que a sua condição
miserável não é um destino inultrapassável ou invencível, reforçará a sua
capacidade de luta, dar-lhe-á a entender que o sentido da evolução histórica aponta
para a derrota da burguesia.
Descendo do ‘céu da especulação’, a filosofia deve inserir-se na realidade
concreta, no terreno histórico, captando o sentido da evolução da história
humana, a causa da inexistência de um mundo verdadeiramente humano e apontando
as condições objetivas que permitirão revolucionar o mundo e dar-lhe um rosto
humano. É esta filosofia — chamada materialismo histórico — empenhada em
tornar-se instrumento eficaz de transformação do mundo, de emancipação e
libertação do homem, que iremos estudar. Iremos assistir à negação da filosofia
enquanto pura e simples teoria e à sua transformação em práxis social. É tempo,
diz Marx, de a filosofia deixar de ser simples interpretação do mundo (muitas vezes incompleta, inadequada e
deformada) ou ilusória transformação deste, para se tornar efetivamente
revolucionária ou transformadora. Orientar a filosofia para a solução real de
problemas reais do homem, eis uma das motivações do pensamento de Marx.
Contexto Socioeconômico do Pensamento de Marx
Nascido quase trinta anos depois da Revolução Francesa, Marx vive numa
época que assiste ao triunfo da burguesia, à aceleração da Revolução Industrial
que se iniciara na Inglaterra e à implantação da ideologia liberal capitalista.
A burguesia proclama a igualdade jurídica e, por vezes, política dos cidadãos,
mas no plano social e econômico impera uma gritante desigualdade.
- Sociologicamente encontramos, essencialmente, duas classes:
- A burguesia, proprietária do capital e dos meios
de produção da riqueza.
- O proletariado, a grande massa de operários
industriais formada pelos antigos artesãos e trabalhadores agrícolas
excedentários que se viram afastados das suas ocupações tradicionais pelo
impacto do desenvolvimento industrial.
O
capitalismo está em pleno desenvolvimento, exaltando a ideia de absoluta
liberdade de competição, do máximo lucro possível. Sem legislação que o
proteja, o operário está à mercê do poder, dos caprichos e dos interesses do
empresário (do patrão), tão livre
para contratar como para despedir. Desenvolve-se o maquinismo e as novas
tecnologias permitem ao empresário usar menos mão de obra, aumentando assim o
desemprego entre os operários.
Os operários assalariados são explorados de forma selvagem,
impiedosa. Como o objetivo do patrão é o de reduzir gastos e aumentar
rapidamente os lucros, as fábricas não têm o mínimo de condições para o
operário: são insalubres, sem qualquer condição higiênica, não têm ventilação
e, por vezes, encontram-se encharcadas. São dirigidas de forma despótica pelo
seu dono ou, mais frequentemente, por capatazes que infligem castigos físicos
ou psíquicos quando não se rende o previsto.
Ao operário exigem-se aproximadamente 14 horas de trabalho diário
(incluindo domingos e feriados, embora,
por vezes, se reduzam algumas horas nestes dias). Contudo, por vezes, o dia
de trabalho atinge às 18 horas, com breves intervalos para comer (o ideal para muitos trabalhadores nessas
circunstâncias era um horário de 60 horas semanais). Em algumas fábricas
criam-se cobertos onde os trabalhadores se amontoam para dormir as poucas horas
de descanso diário.
O salário de miséria apenas cobre as necessidades mais vitais e,
embora possa subir o mais frequente é que desça, tendo em conta a grande
quantidade de desempregados existentes. O trabalho é ferozmente regulamentado:
em muitas fábricas proíbe-se, por exemplo, assobiar, conversar, fumar, havendo
multas para os infratores. Em caso de doença, o operário deve procurar e pagar
a um substituto porque se falta ao trabalho fica sem salário por ‘perda de energia mecânica’. Não existem
nem segurança social nem subsídios de desemprego.
O maior temor, para o operário, é o desemprego. É isso que o faz
tolerar tão más condições de trabalho. O regime de liberdade absoluta existente
nas relações patrão-operário permite àquele despedir o trabalhador por qualquer
causa. A situação dos desempregados é insustentável; sem dinheiro, vêm-se condenados
à fome, de vez em quando atenuada por refeições gratuitas de entidades de
beneficência.
Por outro lado, os empresários recorrem à mão de obra infantil (empregam-se crianças de 5 ou 6 anos) e
feminina, à qual se paga somente um terço ou um quarto do salário dos homens.
Essa mão de obra é fácil de encontrar e de explorar porque as famílias veem-se
obrigadas a empregar todos os seus membros para satisfazer as suas necessidades
mínimas. Muitas vezes as crianças são abandonadas pelos pais ou entregues a
instituições de «acolhimento» que, «para poderem cobrir as despesas», as
empregam em qualquer trabalho (minas,
fábricas, etc.). E tudo isto com o beneplácito dos governos na resposta de
William Pitt aos empresários ingleses que queriam isenção do pagamento de
impostos por causa dos ‘elevados salários’ dos operários: Recorrei às
crianças.
A
experiência mostrou-nos o que pode produzir o trabalho das crianças e as
vantagens que se podem obter empregando-as desde pequenas nos trabalhos que
podem fazer.
Nestas circunstâncias, as possibilidades de educação ou de instrução de
qualquer tipo eram nulas, o que reduzia o perigo da luta e da reivindicação
operárias por falta de preparação e de conscientização.
O regresso do operário a ‘casa’
era a continuação do degredo. As habitações eram de dimensões muito reduzidas e
com um mobiliário mínimo. Elas eram muito úmidas e quase sem ventilação, muito
sujas. A fome e as enfermidades pairavam sobre as famílias, frequentemente
numerosas, que se apinhavam nelas.
As consequências de tudo quanto precede são a proliferação de doenças,
especialmente das vias respiratórias, a alta mortalidade e, por isso, a baixa
esperança de vida (em alguns bairros
operários a média não passava dos 16 anos, ao passo que nos bairros burgueses
superava os 50 anos).
Numerosos relatos se fizeram sobre as penosas condições de vida
dos operários nos países industrializados da Europa. A mais famosa foi
publicada pelo doutor Villermé em 1840 (Engels
na sua obra Situação da Classe Operária em Inglaterra, escrita em 1845, também
se refere a essa condição).
Estes são alguns pontos do ‘Relatório
Villermé’ que servirão para sintetizar informações já apresentadas e
completá-las:
· Jornada laboral de 14 ou mais horas.
· Não havia fins de semana: trabalhava-se
aos domingos e nos dias feriados.
· Nada de «férias pagas» ou não pagas:
«ir de férias» seria eufemismo para perder o emprego.
· Não havia segurança social, ou seja, o
operário doente não recebia qualquer dinheiro: só havia salário quando se
trabalhava.
· Não havia legislação para acidentes de
trabalho: se alguém devido a acidente ficava inválido não recebia qualquer ‘pensão de invalidez’: tornava-se
dependente, ou de familiares ou da ‘caridade
pública’.
· Não existiam reformas: quem, devido à
idade, não pudesse trabalhar iria ficar na mesma situação do inválido por
acidente.
· Os empregados eram despedidos de uma
forma totalmente livre, à vontade do patrão.
O Mundo Operário e suas Condições de Trabalho
O fato mais revoltante era a disposição legal existente em Inglaterra
segundo a qual se podia, antecipadamente, vender o trabalho dos filhos. Vejamos
esta monstruosidade com detalhe: um pai, que trabalhasse o máximo que podia,
devido ao miserável salário que recebia — era a chamada ‘lei de bronze’ do salário, isto é, pagar ao trabalhador o mínimo
para que não morresse de fome — não podia satisfazer por si as necessidades da
família. Então se dirigia ao patrão e pedia dinheiro. Este dava como pagamento
do trabalho que, no futuro, realizasse o filho do operário. Quando este atingir
a idade de começar a trabalhar, que sabemos ser bem cedo, ele iria se encontrar
na seguinte situação: conforme o montante adiantado pelo patrão ao pai,
trabalhará sem nada receber, suponhamos os três, quatro ou cinco primeiros
anos, porque o seu pai já os recebeu (e,
como é óbvio, o dinheiro que o pai recebeu já há muito tempo que está gasto).
Não sendo as únicas vozes que se ergueram contra esta situação revoltante, Marx e Engels pensavam ser aquelas a solução mais eficaz, e as propuseram
contra esta situação do proletariado, contra a ‘escravatura remunerada’.
Contexto Sócio-Político do Pensamento de Marx
O marxismo afirma que cada época cria os seus próprios pensadores,
capazes de elaborar as concepções globais nas quais a problemática do tempo não
só se exprime como encontra projetos conscientes de solução. Esta afirmação
vale também para Marx e Engels. O que a tese inicial quer dizer é que para lá
da influência geral do plano social e histórico nas concepções filosóficas de
uma época, há entre estas algumas que constituem uma resposta sistemática à
problemática da época. Pretende sublinhar que essas concepções são produto
específico dessa época e estão muito vinculadas à sua dinâmica socioeconômica.
A época em que Marx nasce e morre pode considerar-se como a época em que
a burguesia consolida o seu poder, destronando a aristocracia e o absolutismo e
desenvolvendo de forma nunca vista as forças produtivas da sociedade. Ao mesmo
tempo é a época em que outra classe social, a operária, se expande
numericamente e adquire progressivamente autonomia organizativa e política. Se
tivéssemos que definir o marxismo e o seu desenvolvimento conceptual diríamos:
o marxismo constitui a concepção que, partindo da análise das condições
históricas sob as quais se formaram a burguesia e as suas concepções políticas,
revela também as condições em que se constitui a classe que a substituirá no
centro do palco histórico: o proletariado.
Para concretizar a caracterização que fazia da época de Marx o tempo da
consolidação do domínio político da burguesia e da formação e ascensão do
proletariado, cabe assinalar alguns fatos sociais e alguns acontecimentos de
importância vital para o desenvolvimento do pensamento de Marx. A sua vida
decorreu entre 1818 e 1883, abrangendo seis décadas do século XIX. A primeira parte da sua vida tem como marco histórico a
Restauração, isto é, o reestabelecimento dos velhos poderes da aristocracia e
do absolutismo.
A Santa Aliança e Mettemich
contêm o impulso da burguesia e o liberalismo em França, Espanha,
Alemanha, Áustria e Itália. Durante anos parece como se a Revolução Francesa e
Napoleão tivessem existido em vão. A Santa Aliança apoia-se na Rússia, onde os
velhos poderes continuam incólumes, pois, devido ao débil desenvolvimento
econômico, não sofreram ataques sérios por parte da burguesia. No ano de 1848
verifica-se uma grande vaga revolucionária. Na maioria dos Estados o
absolutismo tem de ceder perante os ataques da burguesia radical, apoiada pelo
proletariado. A questão palpitante desse ano é a de saber se essa vaga terá um
desenlace meramente político e de predomínio burguês ou se desembocará numa
revolução social com predomínio proletário.
O conflito que posteriormente arrebenta entre burgueses e
proletários leva a que em França se imponha plenamente o poder burguês, que
generaliza a repressão contra operários e artesãos. França e Inglaterra seguem,
neste aspecto, o mesmo caminho. Nos outros países esse conflito permite aos
velhos poderes (aos absolutistas e aos
aristocratas) recuperar mais uma vez o seu predomínio. O ano de 1848 foi
crucial para Marx e para o seu pensamento. Toma consciência de que a revolução
proletária necessita de mais tempo e de uma classe operária mais numerosa e
preparada. O seu pensamento liberta-se, assim, dos últimos restos utópicos,
para se concentrar na análise, o mais objetiva possível, da realidade econômica
burguesa. O fruto maduro, ainda que não plenamente acabado, dessa análise será
O Capital.
Contexto Intelectual do pensamento de Marx
- as influencias e sua utilização
crítica
Numa obra intitulada Três Fontes
e Três Partes Integrantes do Marxismo, o famoso revolucionário russo Lenine
afirma que o marxismo é o sucessor natural do que de melhor a humanidade criou
no século XIX: a filosofia alemã, a econômica política inglesa e o socialismo
francês. Esta posição de Lenine foi aceite pela generalidade dos historiadores
da filosofia. Tratemos, então, de explicitar:
A
filosofia alemã. — De Hegel recebeu Marx a ideia de que a realidade é um
processo histórico-dialético e que, portanto, se identifica com a História e
com o método dialético. A concepção dialética da realidade significa como já
sabemos que cada figura ou momento histórico contém em si a sua própria
negação, não sendo, portanto definitiva ou estática.
Da chamada esquerda hegeliana, recebeu Marx, a ideia de que a religião é
uma objetivação ou uma projeção ao Infinito das necessidades, desejos e ideais
do homem, concluindo-se daí que é o homem que cria Deus e não o contrário. A
esquerda hegeliana, constituída, sobretudo, por filósofos como Feuerbach e Max
Stirner, critica o caráter especulativo da filosofia hegeliana, centrando-se no
problema religioso. O seu grande contributo consiste na concepção da religião
como alienação do homem.
Apesar de na introdução à sua obra Crítica da Filosofia do Direito de
Hegel Marx ter escrito que a crítica da religião é o ponto de partida de toda e
qualquer crítica, ele irá denunciar o caráter unilateral e abstrato de uma
crítica que se limite ao fenômeno religioso, pois faltaria, segundo Marx,
esclarecer as raízes concretas, materiais ou econômicas, que conduzem o homem à
alienação religiosa e a outras formas de alienação.
A economia política inglesa
Durante o seu exílio em Londres, Marx
estudou profundamente durante muitos anos os economistas ingleses, sobretudo Adam Smith e David Ricardo. A obra destes economistas é, em termos técnicos,
fundamental para compreender a análise marxista da sociedade capitalista. O
contato com a obra de Smith e Ricardo permitiu a Marx conhecer a fundo os
mecanismos da economia capitalista, os processos históricos que produzem a
acumulação de capital, além de lhe ter permitido explicar a situação política
das classes sociais da sua época. Partindo de Adam Smith, mas contrariando o
seu pensamento, Marx estabelece uma ideia muito importante a respeito da
estabilidade das leis econômicas: enquanto que para Adam Smith as leis
econômicas da sociedade capitalista do seu tempo eram leis universais e
necessárias, válidas para todos os tempos e todos os tipos de sociedade, para
Marx essas leis não tinham universalidade nem necessidade, pois eram
simplesmente leis próprias da sociedade capitalista e, portanto, iria durar o
tempo que esta durasse.
O pensamento socialista francês. — Foi considerado por Engels,
grande amigo e colaborador de Marx, como socialismo utópico porque pretendia
transformar a sociedade sem o conhecimento das leis necessárias que regem o
devir histórico. Em termos gerais, é mais um pensamento reformista do que um
pensamento revolucionário. Deve, contudo, destacar-se que de Saint-Simon parece
ter Marx recebido à ideia de que o aspecto mais importante de uma sociedade não
é a estrutura político-religiosa, mas sim, a estrutura econômica, as relações
de produção. Quando nos referimos às influências no pensamento de Marx deve
notar-se que ele adapta perante elas uma atitude extremamente crítica,
desenvolvendo-se o seu pensamento a partir da crítica às fontes que de certa
forma o inspiram.
Fonte
e Sítios Consultados
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