Total de visualizações de página

Powered By Blogger
Administração no Blog

Conteúdos de Administração e assuntos atuais.

20 de maio de 2013

Cultura Organizacional e o seu Poder


 A Cultura Organizacional e o seu Poder
 

De acordo com grande parte da literatura existente, o mineiro se caracterizaria culturalmente por ser ardiloso, austero, astuto, discreto, descontraído, introvertido, reservado, desconfiado, modesto, moderado e tolerante. Já o paulista seria irrequieto, orientado para o trabalho, ligado ao dinheiro e às posses, tenaz, formal e voltado para ação. Mediante essas diferenças culturais, como se teria dado a integração de uma companhia siderúrgica mineira e uma paulista, a segunda adquirida pela primeira no ano de 1993? E se, além disso, a mineira tivesse uma cultura de pequena cidade do interior e a segunda uma cultura de praia?

Pois foi exatamente esse nosso campo de estudo: duas companhias siderúrgicas envolvidas num processo de aquisição em 1993, no qual a adquirente era mineira e a adquirida, paulista. A primeira havia sido privatizada alguns anos antes e tinha participação japonesa, e a segunda era até então estatal.

·       Nota: as empresas em questão são a mineira Usiminas e paulista Cosipa.

As operações de aquisição têm emergido como respostas estratégicas para as empresas conquistarem ou fortalecerem posições de mercado. Produzem impactos econômicos e tecnológicos irreversíveis nos mercados, países e setores em que ocorrem. No entanto, ao eliminar redundâncias de processos e estruturas, reduzir postos de trabalho e excluir pessoas, produzem tensões que podem ser entendidas como competição por território, ou luta pela ocupação de espaços. Esse tipo de disputa é deflagrado quando os indivíduos “percebem” que os territórios que consideram “seus” estão sendo invadidos. Vários autores comprovaram que a competição por espaço é condicionada culturalmente, daí a importância de se terem em mente os traços culturais que permeiam as disputas.

Apesar disso, a maioria dos programas de integração ainda negligencia a dimensão humana e cultural do processo, enfatizando apenas os aspectos técnicos do negócio. Não seria essa a razão do fracasso de grande parte das fusões e aquisições no que tange às expectativas de melhoria de desempenho?

Fomos investigar isso no caso dessas integrações das duas siderúrgicas. Ouvindo mineiros e paulistas, queríamos confirmar ou não que as diferentes percepções culturais precediam o momento das interações pessoais e nelas interferiam. Cada um contou a história da integração segundo o ponto de vista da sua visão de mundo, de sua concepção de negócio e de seu estilo de vida.
 

- A perspectiva dos mineiros

A perspectiva do "mineiro falando de si mesmo" aparece no depoimento de alto executivo que já ocupou cargos importantes na adquirente e hoje pertence ao quadro estratégico da adquirida:

“Eu tava pô... mineiro, né, jacu aqui do meio do mato, né, agora você vai ser diretor [...] dessa... empresa desse tamanho, que você não conhece...”.

A metáfora utilizada pelo entrevistado revela sua modéstia e uma quase incredulidade diante do desafio: ser diretor de uma empresa de grande porte, desconhecida por ele, situada em outro estado. Nesse embate emerge o paradoxo que opõe a modéstia do entrevistado (característica mineira) e a sua competência técnica, razão da indicação para cargo estratégico tão importante. Na figura “jacu” está às qualidades de arredio, reservado, que vive em contato com o natural, no "meio do mato", no ar puro, tranquilo e agora deve aventurar-se no mundo da cidade grande, na qual tudo é artificial, de concreto, poluído, inquietante, talvez hostil.

Surge também a questão da "desconfiança" mineira. Não o suspeitar da honestidade do "outro", mas colocar as coisas sob dúvida, sob indagação. Suspeitar da própria capacidade, como o fez o "jacu aqui do meio do mato", quando foi desafiado a "ser diretor" de "uma empresa desse tamanho", que ele não conhecia.

O mesmo executivo reconhece que existe um estilo mineiro de ser e que vai influenciar a forma de trabalhar:

“Eu acho que esse negócio [...], 'o jeito mineiro de fazer as coisas', é um jeito realmente diferenciado. Quer dizer, nós não somos pessoas que gostam de se expor; nós gostamos de trabalhar em silêncio. E o mineiro é uma pessoa muito aconchegante”.

O entrevistado identifica nos mineiros traços culturais que levam a um "jeito mineiro de fazer as coisas", diferenciado do "jeito de fazer" de outros, no caso, os paulistas. Como pessoas "que não gostam de se expor", os mineiros levam para a empresa esse estilo discreto, que se reflete no gosto por "trabalhar em silêncio", sem alarde, compenetrado no que está fazendo. O entrevistado também vê o mineiro como pessoa amistosa, a despeito de ser arredio e reservado. E mais uma vez, essa característica é levada para o ambiente de trabalho e lá se traduz na forma de recepcionar os colegas da adquirida, torná-los amigos e recebê-los na própria casa:

“...pessoas que vieram da [adquirida] pra treinar na [adquirente] ficaram amigos dos caras, conheceram a casa deles, o que não é coisa de paulista”.

O traço hospitaleiro do mineiro é definido em oposição aos colegas da adquirida, já que se tornar amigo, receber na própria casa e tratar bem não seriam “coisa de paulista”. Essa capacidade de interação também seria o fundamento que possibilita desenvolver o "espírito de equipe", valorizado e adotado pelos mineiros:

“ ...o espírito de equipe, era uma característica muito grande que eu sempre trabalhei na [adquirente]. Na [adquirente], nós sempre trabalhávamos assim; era uma coisa da cultura, de japonês, de mineiro; uma cultura nossa mesmo. E quando nós chegamos na [adquirida]... A [adquirida], num determinado momento, virou uma empresa de metas individuais, o que era exatamente o oposto daquilo com que a gente trabalhava”.

O jeito de trabalhar do mineiro se opõe, assim, ao modo paulista de ser irrequieto, expansivo, agitado, voltado para a ação, mais individualista, preocupado com bens materiais, o que teria transformado a adquirida numa "empresa de metas individuais", uma negação do espírito de equipe, justamente "o oposto" do jeito mineiro de trabalhar em silêncio, sem se expor. A cultura mineira, como produto da convivência com os japoneses, tem outra característica, a disciplina:

“...minha formação, o que eu sou hoje, é tudo de cultura [adquirente], que os japoneses trouxeram de disciplina. Uma coisa que a gente não vê aqui na [adquirida], pelo menos não via quando nós chegamos em 1993, é exatamente isso, o problema da disciplina”.
 

Uma disciplina organizacional rígida, estilo militar, que compromete o grupo com o mesmo modelo de ação. Foi o que os mineiros estranharam na adquirida em 1993, a ausência de disciplina, problema grave que, segundo outro técnico da adquirente, afeta a forma de encarar o trabalho:

“...eu vi e questionei muito é a falta de comprometimento e responsabilidade do pessoal [da adquirida]; eles não procuram abraçar o serviço [...], eles não têm preocupação com tempo, quanto tempo gasta, se tem ferramenta, se o material que tem vai dar ou se não vai dar; não têm uma programação; não fazem uma programação, certo; não fazem um planejamento”.

Esse entrevistado questiona a "filosofia de trabalho" da adquirida, que percebe descomprometida, irresponsável, displicente, negligente, improvisada. É assim que os mineiros da adquirente "viam os paulistas" da adquirida. Isso tem implicações diretas na forma de interação das pessoas destacadas para promoverem a integração das atividades na pós-aquisição.

A perspectiva dos paulistas

A perspectiva do "paulista falando de si mesmo", emerge no depoimento de um técnico da adquirida, que conta as "agruras" de pertencer à adquirida, ao tempo de estatal:

“ ...como eu já falei, as condições na [adquirida] obrigavam a muita improvisação; o cara quer produzir, então improvisa. E o cosipano sempre foi caracterizado por apagar incêndio. Deu um problema aqui, todo mundo resolve e é imbatível pra resolver em tempo”.

O entrevistado reconhece que o paulista é voltado para ação imediata, para o improviso, para apagar incêndios, para a urgência, mas acrescenta outro fator: as péssimas condições da adquirida que, na falta de recursos, obrigavam a improvisar para viabilizar a produção. Eram "solucionadores de problemas" e não executores de ações programadas. E estabelece diferenças em relação aos funcionários da adquirente:

“ O pessoal da [adquirente] vinha com uma outra cultura. A base deles lá, era uma cultura japonesa, da Nippon Steel. Então, é o cara seguidor de normas, seguidor de padrão, eles tinham mais recursos, maiores condições de trabalho, níveis de automação maiores, equipamentos tecnologicamente mais atualizados [...] o pessoal tinha um nível cultural, um nível de conhecimento, até eu diria, superior”.

O técnico da adquirida percebe no pessoal da adquirente, a herança cultural japonesa, do "seguidor de normas, seguidor de padrão", mas também inclui a realidade do parque industrial da adquirente, tecnologicamente mais avançado. Da perspectiva do entrevistado, configura-se a visão simultânea de realidades diferenciadas e perfis profissionais diferentes, e que, no encontro dessas divergências, devem interagir para integrar duas empresas, ratificando situações de origem quase opostas. E, na ótica do mesmo entrevistado, uma das primeiras providências da pós-aquisição teria sido:

“...implantar o espírito de equipe, o respeito que as pessoas têm, umas pelas outras; com o espírito de equipe, as pessoas se protegem, se respeitam”.

O entrevistado testemunha a profunda mudança de atitude e comportamento introduzida na adquirida que, com a adoção do "espírito de equipe", de certa forma, renuncia ao individualismo exagerado e típico dos paulistas, presente na “antiga” empresa dividida, fragmentada, focada em setores, sem visão sistêmica. Reconhece que essa nova mentalidade trouxe consequência imediata:

“...isso acabou com esses feudos, essas panelinhas...”.

Com isso, há mais concentração de esforços no coletivo, nos objetivos organizacionais, nos resultados da empresa, embora as muitas coisas ainda por serem feitas, especialmente quanto à forma de trabalhar:

“ ...o cosipano ainda tem que aprender muito, quanto à prevenção. O cosipano é excelente quando acontece algum negócio pra resolver, apagar incêndio e correr. Mas, tem que ser mais eficaz na prevenção; quer dizer, não deixar acontecerem as coisas, né? Isso aí, eu vejo que no pessoal da [adquirente]... eles estão mais nessa linha de prevenção; quer dizer, eles têm menos emergência, menos surpresas do que a gente tem”.

A despeito das disputas territoriais por espaços organizacionais, parecer haver uma crescente conscientização da necessidade de "profissionalizar" a forma de atuação, incluindo substituir a "filosofia da reação” pela filosofia da prevenção, da regularidade, da programação, da previsão. Talvez com isso, as reações territoriais "impensadas" que tanto prejudicaram a interação de pessoas e a integração de atividades operacionais e administrativas, estejam dando lugar à racionalidade organizacional. É o que está por trás das palavras do mesmo técnico:

“... o que faz sentido técnico ninguém questiona”.

Assim, em vez de adotarem reações territoriais que boicotam as atividades operacionais, os técnicos das duas empresas percebem que, para exploração das sinergias esperadas, só há o caminho da cooperação. E no lugar das armadilhas postas pelos conflitos pessoais, nas discussões vazias sobre saber quem está ou não com a razão, ou quem é melhor do que quem, a saída proposta pelo técnico da adquirida é:

”...vamos levar essa discussão pro nível técnico”.

É no nível técnico da racionalidade operacional que estão as melhores práticas, úteis para potenciar as oportunidades de negócio advindas da aquisição, apesar de que:

“...briga por espaço existe”.

Disputas pelos espaços pessoais e não técnicos que reacendem possíveis competições territoriais nocivas. Assim, apesar das diferenças de traços culturais, parece haver convergência no sentido de valorizar aspectos técnicos, que favorecem a racionalidade e a exploração máxima das potencialidades ensejadas pela junção das empresas. Há, porém, formas de relacionamento com as empresas que se diferenciam, sem prejuízo das práticas operacionais. Relações mais atreladas à "filosofia de trabalho" de cada unidade do que à competência profissional. Segundo pessoa ligada à área gerencial da adquirida, há um leque de "relações" que vão do "irracional" ao "profissional":

“...a relação que você tem lá é de fidelidade ampla, geral e irrestrita e às vezes irracional. A nossa é compromisso profissional, predomina mais isso. Essa diferença eu não sei nem se é cultural, mas é um divisor de águas entre [adquirida] e [adquirente]...”.


A compreensão do impacto cultural

Essas diferenças relatadas aparentemente decorrem da forma pessoal de ser dos mineiros e dos paulistas. Aqueles, mais caseiros, interioranos, retraídos, voltados para a "relação" e comprometidos "pessoalmente" com a empresa. Estes, mais expansivos, cosmopolitas, espontâneos, voltados para a "ação" e comprometidos "profissionalmente" com a empresa.

Existem diferenças pessoais oriundas dos traços culturais, que são carreadas para as empresas e funcionam como "guias de ação" em qualquer circunstância, mesmo em condições ambientais de pressão pela "conformidade comportamental", exercida pelas "culturas organizacionais". É isso que diz um técnico da adquirente, cujas atividades profissionais ensejaram frequentes oportunidades de interação com os "seus pares", na adquirida:

“...você tem que respeitar a cultura [senão]... você estaria prostituindo a cultura da empresa; eu acho aí muito mais difícil [fazer integração]. Então, eu sou muito favorável a uma sinergia, sim, mas eu acho que ela tem um limite; você não ganha sempre na sinergia, não. Quando começou o processo de sinergia, nós achávamos que nós íamos ganhar sempre; em tudo nós podíamos ter sinergia. Nós demos com os burros n'água, porque tem muita coisa que a cultura está acima de qualquer ganho, é interessante. Então, você tem que dar um passo atrás, né? Agora, aquilo em que você tem ganhos de escala, aí você pode tocar, aí dá resultado”.

A interação é "normal", a integração de atividades é "possível" e o ganho sinérgico é"provável", desde que não sejam "agredidos" os valores que guiam as ações das pessoas, seus princípios de ação, seus modos de verem o mundo, darem-lhe significado e atuarem sobre ele.

É nesse sentido, que a "cultura está acima de qualquer ganho”, como disse um dos entrevistados. Os ganhos parecem mais prováveis quando a integração de atividades é direcionada para a exploração objetiva dos processos organizacionais e não para "alteração" comportamental das pessoas.

Por isso, o aspecto regional da cultura demanda análise mais acurada, no sentido de separar o "jeito de ser", que vai influir na "interação" entre pessoas, e o "jeito de fazer", que vai impactar a "integração" de práticas das empresas. Essa abordagem talvez permita alterar o "jeito de fazer" (processo organizacional) sem interferir no "jeito de ser" e no modo de estar e fazer no mundo (visão de mundo, ideias, crenças e valores, que configuram o que se poderia chamar de "cultura" pessoal).

Essa "separação" de pessoas e processos está presente na fala do mesmo técnico da adquirente e retrata a sua experiência em "interagir" com os seus "colegas" ou "pares", da adquirida:

“ ...agora, misturando cultura com sinergia, a coisa nem sempre dá resultado. Misturar cultura e sinergia, nem sempre funciona”.

Essa passagem deixa clara a separação entre o pessoal (cultura) e o organizacional (sinergia), no sentido de resultado da integração de atividades (processos), que o entrevistado chamou de "ganhos de escala" e que vem a ser o incremento estrutural, o "algo mais" que emerge da "articulação das partes" e que é, por sua natureza intrínseca, maior que a simples soma das partes. "Algo mais" que, simultaneamente, à ocorrência do ganho de produtividade operacional, gera impactos econômicos (menor custo de produção) e financeiros (fluxo de caixa). Parece que pessoas e processos fazem parte da mesma dinâmica de aproximação das empresas, porém, a integração de processos depende da prévia interação das pessoas.

Ou seja, é quando os fatores culturais são compatibilizados e transformados em "comportamento operacional" que a integração de processos e práticas e a exploração das potencialidades "sinérgicas" torna-se viável.

Os técnicos envolvidos na execução das rotinas operacionais têm percepção mais centrada na "objetividade" das tarefas do que na valorização das pessoas. É o que transparece no depoimento de um técnico da adquirente, que teve grande participação nas atividades de integração de práticas operacionais:

“Eu acho que técnica não tem cultura”.

O entrevistado desvincula "processo" (elemento organizacional) de "cultura" (dimensão pessoal), numa proposta reducionista para a solução dos conflitos que decorrem da "transferência" de práticas entre empresas, como se fosse possível separar, pacificamente, o homem do que ele faz e do que ele considera "seu". Na aparência, técnica e cultura estão imbricadas e parece impossível separá-las ou estabelecer-lhes uma hierarquia no nível empírico. Esse é um dos pontos problemáticos de uma aquisição, porque as pessoas consideram a técnica (prática operacional) e a forma de executá-la (cultura) como “propriedades” suas e delas não querem abrir mão.



Já para outro alto executivo da adquirente há estreita relação entre cultura e prática, com o que recoloca em pauta toda a complexa problemática da “transferência” cultural nas aquisições:

“...a cultura emana daquilo que advém, da visão, em primeiro lugar, e da missão, em segundo lugar; das posturas adotadas pela administração e como essas posturas são internalizadas na empresa e colocadas em prática. Não é a prática que faz a cultura, mas digamos, a prática legitima a cultura. De repente, você quer implantar uma cultura na empresa, mas não consegue pô-la em prática; a prática, então, seria a legitimação da cultura”.

No depoimento o executivo atribui importância “àquilo” que advém da visão e da missão corporativa e das “posturas” da administração, especialmente, da lógica e da forma como essas “posturas” (discursos) são colocadas em prática. O executivo valoriza a coerência na transformação de “palavras” em ações (práticas) nos níveis tático e operacional. Se a prática é o “lado empírico” dos valores, ela tem o condão de “legitimar” a cultura e os valores que a sustentam. Se os valores são “guias de ação”, as práticas são seus “produtos” diretos. Num retorno à origem, a pratica legitima o valor, que faz parte da cultura, que advém da missão, que é ditada pela visão empresarial.

Essa perspectiva remete novamente para o problema da territorialidade e da "inseparabilidade" do homem e dos seus territórios físicos e simbólicos, já que ambos parecem funcionar como espelho um do outro. A negação disso e o excesso de importância dada ao "sentido técnico" ou à supremacia da técnica sobre a cultura pode ser uma tentativa de simplificar a complexidade humana dos conflitos e suprimir o desgaste provocado pela discussão aberta dos verdadeiros problemas de territorialidade que inibem a interação. Em vez de mergulharem no problema para resolvê-lo na raiz, preferem reduzi-lo a simples questão de prevalência da técnica sobre outros aspectos, especialmente os humanos. Com esse "arranjo social" de acomodação oportunística de forças antagônicas, a vertente da raiz territorial dos problemas permanece intacta, esperando a melhor hora para voltar a se manifestar.

A análise dos aspectos culturais da aquisição, na perspectiva da territorialidade, torna- se ainda mais complexa, quando são incorporadas as particularidades "locais" determinadas pelo ambiente da localização das empresas. Segundo alto executivo da adquirente (ex-presidente da adquirida), o ambiente de localização das usinas teve impacto nas culturas organizacionais e no comportamento organizacional dos funcionários:

“A [adquirente] teve uma vantagem também, que era a sua localização. Como nós estávamos em Ipatinga e, Ipatinga é longe de tudo, você vivia e trabalhava lá. E outra coisa também é o seguinte: como a [adquirida] é ali em Cubatão, a turma ia pra praia, e, na praia, você encontra com essa coisa toda. E ali na praia todo mundo conversava sobre o negócio da [adquirida]. Em Ipatinga a gente não tinha praia, não sabíamos de nada que acontecia lá, nós não estamos em São Paulo. Então, essa diferença de localização, de obrigarem a gente a morar em Ipatinga, que é um lugar muito fechado, favoreceu muito essa cultura da [adquirente]. A [adquirida] não teve essa sorte, porque ela estava em um outro ambiente cultural. Lá em Ipatinga, o nosso universo externo era muito pequeno; você não tinha televisão, não tinha nada. E você ficava 24 horas com a [adquirente]. Na [adquirida], não. O cara ia embora na sexta-feira e só voltava na segunda-feira; ia pra praia, ia pra São Paulo. Então, era um lugar mais arejado, mas, ao mesmo tempo, com menos compromisso [com a empresa]”.

Com isso, aos traços culturais das regiões Minas e São Paulo que orientam o jeito de ser, estar e fazer no mundo, próprio das pessoas, somam-se as particularidades dos lugares que, migrando para dentro das organizações, formam "culturas organizacionais" com características e lógicas próprias, que sinalizam os comportamentos internos. A usina da adquirente (no interior de Minas) recebe maior dedicação dos funcionários pela absoluta e total falta de opções de trabalho e lazer. Já a usina da adquirida está localizada numa região que, por características próprias, favorece a "dispersão". Isso permitiu ao entrevistado classificar os comportamentos de "mais" compromissados na adquirente e de "menos" compromissados na adquirida, embora o "lugar mais arejado" seja favorável às pessoas.

Todas essas manifestações das culturas introduzem problema adicional para a fase de pós-aquisição, já que a interação de pessoas e a integração de atividades dependem da convergência de múltiplas perspectivas pessoais, organizacionais e regionais. Assim, em termos de culturas locais, há quatro perspectivas diferentes:

- mineiros de Belo Horizonte;

- mineiros do interior;

- paulistas da capital;

- paulistas da Baixada Santista.

Acrescente-se a isso as culturas das unidades, sabendo que, nas duas empresas, o perfil cultural das sedes é diferente do das respectivas usinas. Sem levar em conta as histórias de vida de cada um dos representantes das empresas, com sua origem familiar e social, sua formação, suas experiências, suas ideias, crenças, valores e visão de mundo e, especialmente, suas expectativas com relação ao futuro produzido pela união das empresas.

Essa é a complexidade que caracterizou o processo de aquisição abordado neste estudo e que, provavelmente, também está na raiz do insucesso tão frequente das fusões e aquisições empresariais.

 

Saiba mais sobre o estudo

Os autores adotaram o estudo de caso de natureza qualitativa com abordagem descritiva e perspectiva longitudinal. A população-alvo foi de executivos, gerentes e técnicos afetados pela integração. Selecionou-se uma amostra intencional de indivíduos, depois uma amostra do tipo “bola de neve”, com tamanho limitado pela saturação. Dados primários foram coletados por meio de 97 entrevistas semiestruturadas (49 na adquirente e 48 na adquirida). Dados secundários foram obtidos de fontes internas e externas. Dados primários e secundários foram submetidos à análise de interação territorial, complementada pela análise linguística do discurso, com foco na territorialidade e nos aspectos culturais.

 
Fonte e Sítios Consultados

http://www.hsm.com.br/artigos/o-poder-da-cultura-organizacional

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Powered By Blogger

Administração no Blog

Blog Universitário, voltado para temas sobre a Administração Global.

Seguidores

Arquivo do blog

Renato Mariano

Minha foto
São Paulo, São Paulo, Brazil

Pesquisar este blog